Segue assim estrada fora, cheia de nevoeiro liberal a anedota chamada Reino Desunido, aparelho de poder tomado de assalto por extra terrestres de outro mundo, multimilionários que nunca trabalharam, nasceram ricos, casaram com mulheres troféu e dão festas em sunsets…
Segue assim estrada fora, cheia de nevoeiro liberal a anedota chamada Reino Desunido, aparelho de poder tomado de assalto por extra terrestres de outro mundo, multimilionários que nunca trabalharam, nasceram ricos, casaram com mulheres troféu e dão festas em sunsets dourados, avatares paradoxais de uma certa nova ordem estranha de gente sem absolutamente nada para dizer, senão uma cartilha neo liberal idiota em que nem eles próprios acreditam, não sabem o que fazem, e não percebem bem o que dizem; passeiam-se em carros europeus topo de gama e anunciam que querem salvar o povo dele próprio. São o produto da raiva dos eleitorados e deste nosso mundo pornograficamente desigual em que poucos têm tudo e a maioria não tem nada; aterraram vindos do espaço sideral, do seu planeta fortaleza de muros altos, impenetrável à imundície do resto do planeta, são o pináculo da evolução e do sonho de Reagan e a evidência do seu fracasso por serem tão poucos, uma raça de machos alfas e mulheres 10 vestindo fatos Italianos e calçado feito no terceiro mundo, são sempre estrangeiros onde quer que estejam e falam um dialecto cifrado de merdas a ver com mercados, capital e cenas. São a nossa culpa e o nosso medo e foi da nossa lama que nasceram.
Deitar abaixo as estátuas
Escrito em: 2022-09-24
Nem sei bem por onde começar, mas dá vontade de dizer que” não foi para isto que me inscrevi”; relativizando podemos baixar o volume da coisa pensando que se trata apenas de um filme sobre uma sereia, um remake de…
Nem sei bem por onde começar, mas dá vontade de dizer que” não foi para isto que me inscrevi”; relativizando podemos baixar o volume da coisa pensando que se trata apenas de um filme sobre uma sereia, um remake de um filme de animação sobre uma sereia e um caranguejo que fala, sim ok, mas é a mensagem subliminar que se quer passar que a mim, pessoalmente, me irrita, ser igualitário por procuração ou porque a tabelinha de excel diz que é melhor e que pode vir mais pasta a mim soa-me a banha da cobra; dar uma de gajo de esquerda progressista e meter people negro em papeis principais de um clássico da Disney, e logo a “Pequena Sereia”, cuja personagem original (e original será para todo o sempre) só era ruiva e de olhos azuis, sabem o que me faz pensar? Faz-me pensar nos óscares por necessidade de uma qualquer consciência pesada numa indústria cheia de esqueletos no armário para com os negros, os gordos e os deficientes, tudo gente que não apareceu no cinema nem nas séries da Netflix durante décadas, e eu até percebo a necessidade de lavar a imagem….but, not like this.
O reboot de “A pequena sereia” está marcado para 2023
Para mim isto é só ridículo e um desrespeito enorme pela herança cultural e autoral do nosso património colectivo, será que a Pequena Sereia foi mais um sintoma da nossa sociedade intrínsecamente racista e xenófoba, para qual parece que alguns apenas agora estão a acordar? Não me parece, e reescrever a Pequena Sereia em modo Nigga convida ao efeito oposto: 1,5 milhões de não-gostos na 1a release no youtube, uma boa parte deles provavelmente de gente negra. Não é nesta espécie de revisionismo histórico ou cultural que a dita, a minha dita esquerda social-democrata vai cimentar a sua mensagem ou propósito, mas sim no respeito pela nossa herança cultural histórica, que não deve nunca ser reescrita, mas entendida, interpretada e ensinada; não se deve deitar abaixo estátuas, isso é o que os ditadores fazem, mas sim olhá-las como o registo natural dos tempos, a pontuação inevitável do avanço civilizacional. Pintar a Ariel de castanho é uma versão enviesada deste propósito nobre das verdadeiras sociedades progressistas que devem lutar pela autenticidade e honestidade dos seus valores. Queriam uma sereia negra? Escrevessem uma nova história, um novo enredo para uma nova personagem; iria ver de bom grado, assim, vai ser apenas aquilo que de facto a Disney quis que fosse: um panfleto político que esmaga a obra e os seus artistas.
Ai, os homens!…
Escrito em: 2022-08-21
O tema da Masculinidade Tóxica foi aqui o mote para Garland descorrer em modo surrealista durante pouco mais de 100 minutos sobre os cabiantes de um relacionamento abusivo; o seu “Men” encerra por isso uma perspectiva polémica de um homem,…
O tema da Masculinidade Tóxica foi aqui o mote para Garland descorrer em modo surrealista durante pouco mais de 100 minutos sobre os cabiantes de um relacionamento abusivo; o seu “Men” encerra por isso uma perspectiva polémica de um homem, o autor, sobre o universo feminino; Harper, a nossa personagem, é, tal como quase todas as personagens principais nos filmes do realizador, uma pessoa circunscrita a um cenário opressivo, em “Aniquilação”, a floresta, em “Ex-Machina”, o edifício do cientista, e aqui uma casa num tradicional campo Inglês do interiror. A mulher contacta então com uma sucessão de homens, todos com o mesmo rosto (“os homens são todos iguais”), cada qual evidenciando um determinado traço da Masculinidade Tóxica de que Garland quer falar, que aqui é o monstro que assombra Harper, esse monstro simbolizado no Green Men, o homem verde, que no folclore tradicional Anglo-saxónico representa os ciclos ininterruptos de morte e renascimento: as gerações de homens que se sucedem infinitamente , assombrando a mulher/Harper com o mesmo menu de perversões, opressão e violência.
“Men” de Alex Garland
Da terra nasce o homem, dele nasce o menino que quer brincar, que deseja, dele nasce o abusador que oprime e maltrata, depois o padre que viola e julga, e no fim, afinal, todos apenas queriam o impossível: ser amados. A metáfora central do filme, que Garland, inteligentemente, desloca para o final climático, numa cena propositadamente difícil e incómoda para o espectador, revela essa sucessão de renascimentos, a cadeia imparável da opressão sobre as mulheres, elas que se revelam impotentes para amar como os homens precisam, ou querem ser amados. Sim, é polémico, controverso e até perverso, achar que a cadeia da opressão tem génese na natureza e causas no amor. “Men” é o novo de Alex Garland, obviamente, a não perder.
Na margem desse oceano cósmico
Escrito em: 2022-07-14
Não há nenhuma metáfora, nenhum adjectivo, palavra, ou provavelmente nenhuma frase que sequer se aproxime de poder descrever a magnitude da primeira foto de campo profundo do telescópio espacial James Webb que foi revelada pelo presidente Joe Biden; e neste…
Não há nenhuma metáfora, nenhum adjectivo, palavra, ou provavelmente nenhuma frase que sequer se aproxime de poder descrever a magnitude da primeira foto de campo profundo do telescópio espacial James Webb que foi revelada pelo presidente Joe Biden; e neste momento absolutamente histórico invocamos nomes como Isacc Newton, Stephen Hawking, Albert Einstein, Johannes Kepler, Carl Sagan e todos esses homens e mulheres imortalizados na memória desta espécie jovem e sedenta de deslumbramento, e perante o espanto que nos tolhe o coração, perante o vislumbre da imensa abóbada do desconhecido, este nosso regresso às origens, que tem tanto de comovente como de profético, cumprindo o nosso destino rumo às estrelas, emerge uma profunda humildade, um sentimento de união com o Cosmos, os braços de uma mãe, o nosso regresso.
A primeira imagem de campo profundo do JWST foi obtida através de uma exposição de 12 horas, o Hubble teria precisado de mais de 2 semanas, sem contudo ter a possibilidade de captar as faixas de espectro infravermelho
O James Webb não vê como nós, capta radiação infravermelha, uma luz esticada pela própria expansão do universo, e dessa forma mergulha no oceano de tempo rumo às profundezas da escuridão infinita, tocando a face de Deus, lá longe, onde nos reencontramos, o universo que se interroga a ele próprio, como escreveu Sagan. Nesta imagem de galáxias a perder de vista, vemos estrelas e mundos como foram quando o nosso universo tinha pouco mais que alguns milhões de anos, vemos a gravidade numa escala sem precedentes: a forma como molda e deforma o próprio tecido do espaço, a lente gravítica de um cluster no centro da imagem é a assinatura de algo ou alguma coisa que apenas agora começamos a compreender; o denso mistério da gravidade é a nossa porta de entrada no oceano de tempo que nos levará até ao instante da criação.
O James Webb já nos dá respostas a perguntas que ainda nem sequer colocamos e a jornada só agora começou. Perante o coração apertado, perante o puro deslumbramento, sentimo-nos como uma criança naquele primeiro dia na margem de uma praia, olhando o mar, e lá longe, o horizonte. Lembram-se? Estamos de volta.
Cinema hipersónico
Escrito em: 2022-06-12
“Top Gun – Maverick” é um triunfo do cinema moderno. E Tom Cruise cimenta-se ainda mais como o mais valioso e competente produtor da actualidade. Depois dos excelentes “Rogue Nation” e “Fallout”, dois tratados conclusivos de como fazer filmes de…
“Top Gun – Maverick” é um triunfo do cinema moderno. E Tom Cruise cimenta-se ainda mais como o mais valioso e competente produtor da actualidade. Depois dos excelentes “Rogue Nation” e “Fallout”, dois tratados conclusivos de como fazer filmes de ação, acresce este segundo capítulo da saga do Capitão Pete “Maverick” Mitchell, agora sem o seu “Wing man” Iceman ( Val Kilmer num papel quase de cameo e com uma degradação física já indisfarçável ), liderando uma equipa de jovens ases numa missão impossível (não resisti), com flashes do passado, a dose certa e indispensável de azeite homo-erótico, nem faltou volleyball de praia, onde os homens tinham menos roupa do que a actriz, ok, e sobretudo uma sensibilidade incomum neste segmento de filmes, doseando correctamente a herança de Tony Scott com o pragmatismo do envelhecimento das personagens, a factura do tempo, e até o contexto político (excelente a introdução do paradigma da substituição dos pilotos pelos drones, por exemplo).
Top Gun Meverick
Mas “Top Gun – Maverick” é sobretudo um triunfo técnico; o filme foi rodado usando caças F-18 reais adaptados para poderem incorporar câmeras IMAX especialmente modificadas para o efeito, os actores voaram de facto nas aeronavas em maior parte das cenas, a esmagadora maioria dos efeitos que vemos foram práticos e feitos “in camera”, e, claro, é mesmo Tom Cruise que vemos pilotando a sua Kawasaki com o pôr do sol laranja em plano de fundo. Que mais podemos querer? Absolutamente imperdível, um espectáculo total e arrebatador, simbólico da excelência técnica do cinema actual.
Geração instagram
Escrito em: 2022-06-01
É já indubitavelmente um dos maiores acontecimentos do streaming e da nossa cultura pop contemporânea esta “reescrita” da nova adolescência, uma repintura do quadro do amadurecimento sexual no mundo do egoísmo, das drogas e da ausência interior. A geração Instagram,…
É já indubitavelmente um dos maiores acontecimentos do streaming e da nossa cultura pop contemporânea esta “reescrita” da nova adolescência, uma repintura do quadro do amadurecimento sexual no mundo do egoísmo, das drogas e da ausência interior. A geração Instagram, em que o ser humano anda sempre despido onde quer que vá, é retratada com a crueza necessária para nos transmitir o labirinto desta prisão emocional, pessoas que parece que nunca saem do lugar, que apenas dizem que querem sem nunca de facto conquistarem o que quer que seja. Produzida, entre outros, por Drake, um dos mais conhecidos rappers da actualidade, e em que cada episódio da 1a temporada é um título de um sucesso rap, é um remake de uma série Israelita homónima, que sublinhava ainda mais o confinamento emocional das suas personagens entre os muros ideológicos da Israel do sec 21, sendo que a versão americana se presta a ser além disso um manifesto visual que usa uma edição inteligente e uma fotografia repleta de cores primárias para nos criar um sentimento extra de sobressalto e náusea.
Zendaya é a estrela maior em “Euphoria”
“Euphoria” retrata a vida de uma drogada, a Rue, e a sua autoestrada de degradação, questionamento, e auto destruição lenta, o caminho que percorre junto com os seus amigos, pais, e conhecidos num universo povoado de porno, pénis erectos, violência, inveja, e um grande vazio emocional; essa geração zombificada por uma sociedade centrada na juventude e na beleza, é aqui retratada numa série de reflexões de uma drogada que na sua vontade de lhe escapar nos obriga por isso a olhar de fora. E é esse olhar propositadamente exterior que é tão incómodo. Sem própriamente nada de muito novo na maneira como nos entrega a história, e com uma terraplanagem política demasiado evidente (o racismo não existe, o bullying não existe, as gordas sem bodyshaming, os transexuais não são vítimas de nada e os negros até vivem em boas casas e vão estudar para a faculdade), “Euphoria” acaba por ser a grande pedrada no charco do streaming deste início de década pela ousadia e pela vontade de falar da adolescência de forma desapaixonada e crua, sem o bullshit do costume. A geração que empina o cu no Instagram como nunca a viu.